sexta-feira, 16 de setembro de 2016

O que faz um Indie Game?


Hyper Light Drifter: ousado, pixelado, independente e maravilhoso
 
Historicamente recente e possibilitada pelo surgimento de espaços como a Xbox live, o Steam e a PSN, a cena dos games independentes se torna cada vez mais robusta e respeitada. Já existe um corpo variado de títulos e dentre eles já surgiram nomes que marcaram toda a indústria para sempre como Braid, Bastion e Super Meat Boy. Mas o que exatamente faz um game ser indie? A resposta parece óbvia, mas é um pouco mais complexa conforme nos aprofundamos.

A primeira questão a apontar é o que não é indie, no caso, as mega produções da indústria dos games — os chamados games "AAA" pela mídia especializada. Assassin's Creed não é indie, God of War, Call of Duty e Last of Us também não.
O que impede esses títulos de serem considerados “independentes”?
A primeira definição que encontramos na ponta da língua de alguns profissionais e entusiastas dos games é que uma desenvolvedora indie é aquela que não responde financeira ou administrativamente a outra empresa. Essa definição se aproxima da lógica da indústria fonográfica, em que um artista que não trabalha submetido a uma grande gravadora ganha o título de indie. Por essa lógica, os games criados por  uma desenvolvedora indie seriam indie games. Ponto.

Last of Us da Sony é uma megaprodução de uma mega produtora. Ninguém pensaria nele como Indie.
A definição, no entanto, é insuficiente. A Epic games, famosa por títulos "AAA" da série Gears of War é completamente independente financeiramente. Isso faz Gears of War ser indie? Pela lógica puramente econômica/administrativa, sim. Isso, entretanto, não faz o game ser parente de Hyper Light Drifter ou Transistor para nossas impressões como jogadores.

Isso nos leva a um outro polo de definição: indie game seria todo game cuja motivação principal não é o sucesso financeiro, mas a paixão. Seriam games feitos com uma visão e integridade interna que não se compromete com a busca por lucro. Mais uma vez a coisa pode ser complexificada, afinal os games são uma indústria e a simples intenção de se lançar numa rede como o Steam ou a PSN dificilmente pode ser considerada como um simples desprendimento autoral. Assistindo o (ótimo!) indie Games the movie vemos a tensão dos criadores de Super Meat Boy com a possibilidade de sucesso do game na Xbox Live, e nem por isso o game é construído de maneira “vendida” e “comprometida” ou deixa de ser visto como um dos maiores e mais influentes hits indie.

A definição varia, é vaga, controversa etc. Porém, como jogadores, todos nós conseguimos concordar bastante ao identificar certos games como indie. Minha impressão é que ambos os discursos se complementam.
Dizer que só indie games são motivados “por paixão” seria desrespeitar milhares de pessoas que trabalham na indústria no desenvolvimento de jogos "AAA" ou simplesmente para grandes produtoras. A diferença crucial é que num projeto de milhões de dólares bancado por empresas do tamanho da Warner e da Sony a tendência é que a liberdade criativa seja preterida em relação à segurança de lucro. Essa segurança de lucro está em dar mais do que já deu certo para o público, mesmo que isso queira dizer inibir em muito a possibilidade de inovação.

Games com o valor de produção de Doom são automaticamente identificados como "AAA"


A verdade é que nós, como público, falamos muito que queremos inovação e criticamos o “mais do mesmo” de uma série como Call of Duty, mas nenhuma arte na história consistiu somente de inovação estilística constante. Nós íamos surtar se de fato a cada tantos meses as jogabilidades inovassem em tudo; os clichês são clichês porque funcionam. Estagnação incomoda sim e deve incomodar, mas o fato da indústria parir várias ondas de games parecidos deve ser visto como algo normal.
Ao mesmo tempo seria incorreto dizer que indie é qualquer game que não tenha “rabo preso” com uma publisher. Isso implicaria que qualquer um que faz um game sem a pressão de uma empresa financiadora automaticamente é um inovador do gameplay e/ou da estética dos games. Basta olhar para a Valve para descartar essa possibilidade. O modo de trabalhar deles valoriza inovação e possibilitou games como Team Fortress, Portal e Portal 2, porém não há dúvida do gigante de empresa que ela é. A Thatgamecompany está sob o julgo da Sony e mesmo assim criou algumas das experiências mais inovadoras e sensíveis em muito tempo com Journey e Flower.

Journey, da Thatgamecompany, tem todo o jeitão que nós entendemos como indie, mas é bancado pela Sony.

















O que me parece é que há sim um “espírito indie” de quem quer criar novidades e obras que não se submetam ao mercado, mas à sua integridade interna ou autoral. Esse espírito é imensamente positivo e muitas vezes tem sido a força que não permite que o mundo dos games se paralise. O “Espírito Indie” vai surgir mais frequentemente sem as pressões por lucro de uma grande publisher, mas a mesma publisher pode se permitir dar espaço para isso dentro dos seus projetos, como foi citado da Sony e da Valve. A tendência aos clichês e repetição de tópicos também vai ter mais frequência entre os projetos multimilionários — por uma questão puramente mercadológica — mas pode haver cabeças estagnadas fora das grandes publishers também.
No atual momento o termo indie parece insuficiente, uma vez que usamos ele muito mais para falar desse espírito do que de condições econômicas ou administrativas dos criadores. O que mais nos importa aqui é a força criativa que essa parcela da indústria traz e que eventualmente impregna os próprios games "AAA". No cinema há variados níveis de complexidade estética — indo do Transformers mais explosivo ao David Lynch mais insondável. Os games, portanto, demonstram amadurecimento enquanto forma expressiva com o surgimento dessas “vanguardas” no seio dos chamados indies.
Devore o melhor dos dois mundos. Para cada Bastion, ou Papers Please vai ter um milhão de indies malfeitos e hiper pretensiosos. Da mesma forma, para cada Metal Gear Solid 5 nós vamos engolir uma leva de Homefront's e outras super produções pouco inspiradas. Não existe inovação sem uma estabilidade de onde ela parta e essa estabilidade iria definhar e morrer sem o impulso inovador.







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